quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

In the Valley of Elah

Era uma vez um rapaz chamado David que, contra tudo e contra todos, decidiu engolir o seu medo e enfrentar um gigante. No vale de Elah, David venceu Golias e o mundo que conhecia mudou para sempre. O menino tornou-se homem…

Este é apenas o segundo filme de Paul Haggis, mas dada a qualidade do primeiro, o oscarizado Colisão, a curiosidade em relação a este No Vale de Elah é mais do que justificada. E Paul Haggis não desilude. Não tem certamente o mesmo impacto de Colisão, mas é um filme ao qual é difícil ficar-se indiferente.

A história tem como pano de fundo a guerra no Iraque, considerada por muitos como o Vietname dos nossos dias. Uma guerra sem justificação nem fim à vista, que mais não faz do que mutilar famílias e destruir corações. Não se enfrentam gigantes sem que a nossa percepção do mundo se altere. Quem consegue regressar jamais será a pessoa que partiu. Uma geração que vai perdendo parte da sua humanidade. No final do filme, quando o peito ainda está apertado, por tudo o que se viu e sentiu, e tendo ainda bem presente a mensagem do arrepiante plano final, Haggis mostra uma pequena dedicatória. Uma foto, certamente a que deu origem à história que acabou de ser contada e uma frase: “Para todas as crianças.” Porque aqui não há distinções. É no nascimento e na morte que nos revelamos iguais. É de lamentar as crianças iraquianas que morrem neste conflito insano, mas também, as crianças americanas a quem são dadas armas e inimigos sem rosto.

Tommy Lee Jones é o sargento Deerfield a quem é comunicado que o seu filho está desaparecido desde que a sua companhia regressou aos Estados Unidos. A busca pela verdade começa. De início, um pai que procura um filho desaparecido, de seguida um pai que busca justiça para um assassinato. Cedo ficamos a saber que Mike está morto e que ao contrário do que se imaginaria, morreu no seu país quando já não estava em combate. Facilmente Haggis poderia tornar esta história num thriller moralista, mas o que lhe interessa, mais do que os actos, são as pessoas por detrás deles. Quem somos verdadeiramente e quais os botões que quando premidos despoletam a nossa mudança. Assim, não nos é apresentada qualquer personagem fácil, apenas seres complexos e com defeitos e, por isso, infinitamente humanos.

Os actores são de alto calibre e como tal, boas performances são mais do que garantidas. Charlize Theron agarra com unhas e dentes uma personagem que nas mãos de outro realizador seria certamente um novelo de estereotipos, a detective responsável pelo caso do assassinato de Mike. Susan Sarandon, por sua vez, interpreta a mãe do jovem, e apesar de só aparecer durante cerca de 10 minutos ao longo de todo o filme, a sua interpretação é arrepiante, sendo o contraposto perfeito para a personagem de Lee Jones.

Mas, depois de tudo isto, há algo que é preciso realçar. Tommy Lee Jones. Por muito bom que o filme seja, a sua interpretação é o elemento que ficará gravado a ferros na memória. O seu sargento Deerfield é um exercício de contenção absolutamente esmagador. Cada rasgo de dor parece ainda mais doloroso porque ele não o exprime. A sua interpretação é tão complexa e carregada de nuances que é difícil avaliá-las a todas. Numa cerimónia em que o Óscar de melhor actor parece mais do que destinado a Daniel Day Lewis, arrisco-me a dizer que não me espantaria se Tommy Lee Jones se revelasse a surpresa da noite.

Julgamos conhecermo-nos uns aos outros e por isso deixamos de nos ouvir. Fazemos das nossas crenças leis. Olhamos em frente para não nos desviarmos do caminho. Ignoramos quem nos chama. E por vezes os gritos de ajuda são meros sussurros ao ouvido. Se ao menos parássemos para lhes prestar atenção… Numa palavra, assombroso.


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